Profissionais de Psicologia, estudantes e acadêmicos de todo o Brasil se reuniram em Dourados (MS), entre os dias 7 e 9 de agosto, para discutir o papel da profissão nas questões indígenas do país. O I Encontro Nacional Psicologia, Povos Indígenas e Direitos Humanos, marcado pela diversidade, contou com mais de mil psicólogas (os) durante os três dias e reuniu 61 palestrantes. A organização foi do Conselho Regional de Psicologia do Mato Grosso do Sul (CRP-14) e teve o apoio do Conselho Federal de Psicologia (CFP).
O presidente do CFP, Humberto Verona, e o coordenador da Comissão Nacional de Direitos Humanos (CNDH) do CFP, Pedro Paulo Bicalho, estiveram presentes na mesa de abertura. A conselheira do CFP, Sandra Amorim, participou da mesa que tratou da violência contra a mulher indígena e apresentou o documentário “Uma lei para todas”, sobre a Lei Maria da Penha.
Além das mesas, mais de 20 trabalhos sobre o tema, produzidos por psicólogas (os) de diferentes estados do país, foram expostos. “A visibilidade do encontro foi muito grande e representou um avanço para a temática, que ainda é alvo de preconceitos”, constatou a conselheira Sandra Amorim, que ressaltou a qualidade dos debates e trabalhos.
Para Humberto Verona, o evento deu início à construção de um diálogo sobre o tema em que indígenas participam com voz em conjunto com outros segmentos da sociedade.
Verona destacou também o protagonismo de Mato Grosso do Sul frente às questões indígenas. “O estado, além de ser uma comunidade indígena expressiva do Brasil, é destacado pela militância dos povos e articulação que vem sendo feita”.
A indissociabilidade da Psicologia e dos Direitos Humanos e destes com as questões indígenas foi ressaltada por Pedro Paulo Bicalho em sua fala. “O encontro inaugurou uma discussão nacional que acontecia apenas timidamente e de forma regional. A partir deste entendimento podemos construir fundamentos importantes para a nossa sociedade”, acredita.
Participação indígena
A profundidade do encontro foi grande e ultrapassou os conhecimentos teóricos, segundo a conselheira Amorim. A razão esteve nas trocas e intercâmbios com os diversos profissionais indígenas – em sua maioria psicólogas (os) – presentes no evento. Foi o caso das discussões sobre o alto índice de suicídios entre indígenas nos últimos anos, especialmente em Dourados.
A associação da terra com a saúde mental também foi explicada por indígenas aos demais presentes. Segundo eles, ao perderem o vínculo com a terra – que é como uma mãe – as referências também se perdem. Os rituais espirituais, por exemplo, só podem ser feitos sob a terra em que seus antepassados estão enterrados.
A participação nos debates também foi expressiva, como no caso da mesa sobre a violência contra as mulheres, formada basicamente por indígenas. “Estas mulheres deixaram uma questão clara: que com a entrada da ‘civilização’, a violência aumentou, pois não era inerente às populações indígenas”, afirmou a conselheira Sandra Amorim. “E quando buscam auxílio nas delegacias são frequentemente mal atendidas e tratadas de forma preconceituosa”, acrescentou.
Para o organizador do evento, o presidente do CRP-MS, Carlos Afonso Marcondes, as psicólogas e os psicólogos precisam se debruçar sobre essa questão e voltar os olhos para o sofrimento dos indígenas. “O Mato Grosso do Sul tem a segunda maior concentração de indígenas do País e precisamos entender que esse povo em sofrimento precisa de ajuda e precisa ser ouvido. Por isso precisamos construir um diálogo de empatia e trabalharmos juntos em prol da vida que temos em comum, independente da cor, da pele e da raça”, afirma.
Para tratar das aflições dos povos indígenas de Mato Grosso do Sul, o índio Terena, Nito Nelson, presente no Encontro, ressaltou a importância dos Conselhos Indígenas para discutir políticas públicas para as aldeias. “Apenas Campo Grande possui um Conselho Indígena e o ideal é que toda cidade onde há comunidades indígenas tenham seus conselhos. Este também foi um de nossos objetivos para este evento”, complementou Nito.
Para a indígena Cristina, da tribo Tembé, do Pará, convidada pelo Conselho Regional de Psicologia do Pará para participar do I Encontro, esta foi uma oportunidade de discutir políticas de saúde para dentro das aldeias. “Penso que a discriminação é grande e continua, mas estamos conseguindo quebrar esse tabu. Espero que possamos levar as falas ditas neste evento para os tomadores de decisão a fim de beneficiar a saúde das pessoas em nossas aldeias”, comentou.
Resultados
As quase 40 propostas debatidas e construídas ao longo do evento pelos palestrantes, com o apoio dos participantes, servirão de subsídio para as ações que visam a melhoria da saúde indígena. As propostas irão compor um documento que será apresentado na V Conferência Nacional de Saúde Indígena, realizada em novembro de 2013, além de serem encaminhadas ao CFP, aos governos Federal, Estadual e Municipal e às universidades.
A gravação da primeira edição do evento estará disponível em breve – na íntegra – nas redes sociais e no site do CFP.